As eleições municipais serão um grande teste para as novas regras impostas pela minirreforma política que vetou a doação de pessoas jurídicas a candidatos. Em tempos de Operação Lava-Jato, que demonstrou a promiscuidade nos financiamentos de campanha por grandes empreiteiras, com recursos desviados por meio de contratos bilionários com a Petrobras, a torneira das verbas políticas fica restrita às doações de pessoas físicas. Com o aperto no cinto, a grande pergunta é quem sai na frente. Para o advogado Marlon Reis, integrante do Comitê do Movimento de Combate a Corrupção Eleitoral, responsável pela Lei da Ficha Limpa, sem o direito fácil, a vantagem nessa corrida eleitoral será dos grupos organizados, como o dos religiosos.
O advogado, defensor do fim das doações por empresas, diz que com a redução dos recursos de campanha, os candidatos terão de contar com a mobilização dos movimentos sociais, fazendo com que o foco deixe de ser os recursos econômicos. Reis, que pediu exoneração do cargo de juiz de Direito em abril para se dedicar à advocacia eleitoral, também reconhece que, além da proibição de irrigar campanhas com os recursos de grandes empresas, a crise e a Operação Lava-Jato também vão ajudar a enxugar as contas para a eleição municipal.
Na mesma linha de Marlon, o advogado Wederson Advincula Siqueira, também especialista em direito eleitoral, diz que a próxima eleição será um “grande balão de ensaio”. E vai obrigar os candidatos a suar mais a camisa, retomando o velho corpo a corpo com o eleitor. Lembra ainda que não existe no Brasil a tradição de doações de pessoas físicas, o que torna o cenário ainda mais árido. “Nos Estados Unidos, onde esse tipo de financiamento é comum, ele irrigou a campanha de Barack Obama com a significativa quantia de U$ 500 milhões”, comenta.
Diante disso, Wederson acredita que alguns grupos políticos saiam mesmo na frente. Em primeiro lugar, ele cita políticos que são financiados pelo narcotráfico, que “sempre inundou as campanhas eleitorais com o dinheiro ilícito”. “Esse dinheiro faz a diferença e existe uma preocupação mundial para tentar barrar esse tipo de doação”, alerta Wederson. Em seguida, ele acredita que saem em vantagem também os candidatos já conhecidos, como artistas, jogadores de futebol, radialistas, apresentadores de TV e religiosos. O advogado lista também os candidatos milionários, capazes de bancar sozinhos suas próprias campanhas políticas.
COFRES De acordo com a Receita Federal, em seu último levantamento realizado em 2012, a bilionária cifra de R$ 21,5 bilhões ingressou nos cofres das igrejas católicas e evangélicas. Com tanto dinheiro, os especialistas reconhecem que os grupos religiosos saem mesmo em vantagem em relação a movimentos sociais menos arrecadadores. Wederson, no entanto, adverte que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que há anos se recusava a admitir a tese, já reconhece o abuso do poder religioso em ações eleitorais, em razão de doutrinações, em suas jurisprudências.
Nas igrejas, segundo a Leão, as doações respondem por 72% do dinheiro em caixa. O restante equivale a rendimentos gerados com aluguel ou venda de bens, aplicações em renda fixa ou mesmo, em casos mais raros, operações em bolsa de valores. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em levantamento de 2010, revelam que as cadeiras para pastores no Congresso Nacional aumentaram 61% na década passada (2000-2010). Por sua vez, a Frente Parlamentar Evangélica (FPE), encabeçada pelo deputado e pastor João Campos, agrega mais de 90 parlamentares, segundo dados atualizados da própria frente, o que representa um crescimento de 30% em relação à última legislatura. O promotor eleitoral Edson Resende de Castro diz que não existe qualquer ilegalidade na doação de fiéis aos candidatos de suas igrejas, entretanto, ressalta que o que não pode haver é uma “coação em nome da crença”. (Com informações MS Verdade).